27/05/2011 08h38 - Atualizado em 27/05/2011 09h13
Documentário exclusivo lembra os dez anos do gol histórico de Petkovic
Os principais personagens daquele momento épico, que garantiu ao Flamengo o tricampeonato carioca de 2001
Uma falta fez o Maracanã inteiro se silenciar. O tempo pareceu parar. Expectativa. Tensão. Nas arquibancadas, as mãos dos torcedores rubro-negros tremulavam. Sob o olhar de Zagallo, a bola viajou. Ganhou uma trajetória improvável. Mas encontrou o rumo e entrou no único lugar possível fora do alcance do goleiro Helton. Um momento épico. Inacreditável. Inesquecível. E o dia 27 de maio de 2001 entrava para a história. O sérvio Dejan Petkovic, que por pouco não jogou aquela partida, também.
O GLOBOESPORTE.COM preparou um documentário exclusivo sobre este capítulo brilhante da história do Flamengo. São 9m29s capazes de fazer os rubro-negros viajarem no tempo. Petkovic, Zagallo, Edílson, Joel Santana e Fabiano Eller recordam daquele momento marcante do futebol brasileiro. Dez anos se passaram. Mas as lembranças e as emoções parecem permanecer fortes nos principais personagens daquele lance.
- Era uma fracção de segundo para ganhar ou não o tricampeonato. E estava tudo nos pés do Pet. O inacreditável aconteceu... - lembra Zagallo.
- Quando eu olhei a bola saindo eu pensei: vai. Ela (a bola) tomou aquela energia pela vibração da torcida. Todo mundo acreditou que poderia ser gol - disse Petkovic.
- Não tinha mais o que fazer, sinceramente - admite Helton.
- Quando Deus quer as coisas, não tem jeito - lamenta Fabiano Eller.
FONTE GLOBOESPORTE.COM.
O GLOBOESPORTE.COM preparou um documentário exclusivo sobre este capítulo brilhante da história do Flamengo. São 9m29s capazes de fazer os rubro-negros viajarem no tempo. Petkovic, Zagallo, Edílson, Joel Santana e Fabiano Eller recordam daquele momento marcante do futebol brasileiro. Dez anos se passaram. Mas as lembranças e as emoções parecem permanecer fortes nos principais personagens daquele lance.
- Era uma fracção de segundo para ganhar ou não o tricampeonato. E estava tudo nos pés do Pet. O inacreditável aconteceu... - lembra Zagallo.
- Quando eu olhei a bola saindo eu pensei: vai. Ela (a bola) tomou aquela energia pela vibração da torcida. Todo mundo acreditou que poderia ser gol - disse Petkovic.
- Não tinha mais o que fazer, sinceramente - admite Helton.
- Quando Deus quer as coisas, não tem jeito - lamenta Fabiano Eller.
FONTE GLOBOESPORTE.COM.
Locutores lembram curiosidades envolvendo o gol de Petkovic
Luís Roberto, Luiz Carlos Júnior e José Carlos Araújo contam em detalhes os momentos que ainda emocionam a torcida rubro-negra
Há exatos dez anos, uma cobrança de falta, aos 43 minutos do segundo tempo, mudou o rumo de uma partida, deu um tricampeonato estadual ao Flamengo, transformou um sérvio em ídolo e emocionou milhares de pessoas que contemplaram o feito. Os torcedores rubro-negros nunca se cansam de assistir àquele lance, protagonizado por Petkovic e que deu a vitória por 3 a 1 sobre o Vasco em 2001. E cada narração daquele gol reserva uma história diferente não só para o público, como também para os próprios locutores.
Luís Roberto, Luiz Carlos Júnior e José Carlos Araújo contam a seguir como viveram aquele domingo: os momentos antes da cobrança de falta e a narração do gol e do título rubro-negro.
Luís Roberto, da TV Globo: 'Em cobrança de falta, a pessoa para em casa e vê'
- Na chegada ao Maracanã, vi uma pessoa com um cartaz onde estava escrito 3 a 1. Provavelmente tinha cartazes de todos os placares, mas o que eu vi foi aquele, com o 3 a 1, e fiquei com isso na cabeça. O jogo se desenvolveu de uma forma muito legal para narração. Por ser um gol de falta, de bola parada, a jogada é configurada e dificilmente o locutor vai errar. E em cobranças de falta, de pênalti, a pessoa em casa para e vê. É um gol sem ruído. A nossa cabine era bem daquele lado, de frente para onde o Pet se jogou no gramado. Lembro-me do Zagallo indo comemorar... O mais legal é o delírio. O Maracanã já tremia mesmo, era normal, mas foi um frisson. O gol entrou para a história. Em proporções, talvez aquele gol tenha marcado mais que o do Angelim, no título brasileiro (em 2009).
Luiz Carlos Júnior, do SporTV: 'Paravam ao meu lado e diziam 'reza Alessandro''
- Eu sabia que o Pet batia bem. Você sente que o lance é perigoso, e a sensação era de que dificilmente teria outra chance como aquela. Podia ser o momento do título tanto para o Flamengo como para o Vasco. Foi um gol histórico. Tornou-se um dos mais emocionantes que já narrei. A narração é uma coisa muito no reflexo, vai da nossa sensibilidade do momento. Não é nada premeditado, você simplesmente vai e faz. Geralmente falo primeiro o nome do time e logo em seguida o nome do jogador. Mas, naquele gol, fiz uma pequena pausa antes de falar o nome do Pet. Isso acabou deixando o ritmo um pouco diferente e ficou só a torcida de fundo. Ao longo dos anos essa narração foi muito acessada no Youtube e, se não me engano, o vídeo na internet começa comigo falando “reza Alessandro”. E durante muito tempo as pessoas paravam ao meu lado e diziam “reza Alessandro” e “que golaço do Pet”. Mas eu não me lembrava da minha narração e não associava uma coisa a outra. Um dia resolvi perguntar e a pessoa me explicou que estava repetindo a forma como narrei aquele gol.
José Carlos Araújo, da Rádio Globo: 'Nessa hora a gente extravasa, extrapola'
- Eu me lembro do Pet colocando a bola no ângulo esquerdo, o Helton ainda tocando na bola... Por ser quase no fim, a expectativa é maior do que se fosse no início de um tempo, e ficou marcado por isso. Não era como o gol mil do Pelé, que o Waldir Amaral se preparou para narrar. Foi um negócio surpreendente, podia dar tanto para um lado como para o outro. Nessa hora a gente extravasa, extrapola... É o que a torcida espera da gente nesse momento. A torcida que conduz a transmissão. Mas naquele momento você não está torcendo, você é apenas um instrumento para transmitir a emoção do lance. (Os últimos minutos) eram praticamente de ovação, comemoração... Como se já tivesse acabado naquele momento (da falta).
Confira o infográfico com detalhes do gol de falta de Petkovic:
Luís Roberto, Luiz Carlos Júnior e José Carlos Araújo contam a seguir como viveram aquele domingo: os momentos antes da cobrança de falta e a narração do gol e do título rubro-negro.
Luís Roberto, da TV Globo: 'Em cobrança de falta, a pessoa para em casa e vê'
- Na chegada ao Maracanã, vi uma pessoa com um cartaz onde estava escrito 3 a 1. Provavelmente tinha cartazes de todos os placares, mas o que eu vi foi aquele, com o 3 a 1, e fiquei com isso na cabeça. O jogo se desenvolveu de uma forma muito legal para narração. Por ser um gol de falta, de bola parada, a jogada é configurada e dificilmente o locutor vai errar. E em cobranças de falta, de pênalti, a pessoa em casa para e vê. É um gol sem ruído. A nossa cabine era bem daquele lado, de frente para onde o Pet se jogou no gramado. Lembro-me do Zagallo indo comemorar... O mais legal é o delírio. O Maracanã já tremia mesmo, era normal, mas foi um frisson. O gol entrou para a história. Em proporções, talvez aquele gol tenha marcado mais que o do Angelim, no título brasileiro (em 2009).
Luiz Carlos Júnior, do SporTV: 'Paravam ao meu lado e diziam 'reza Alessandro''
- Eu sabia que o Pet batia bem. Você sente que o lance é perigoso, e a sensação era de que dificilmente teria outra chance como aquela. Podia ser o momento do título tanto para o Flamengo como para o Vasco. Foi um gol histórico. Tornou-se um dos mais emocionantes que já narrei. A narração é uma coisa muito no reflexo, vai da nossa sensibilidade do momento. Não é nada premeditado, você simplesmente vai e faz. Geralmente falo primeiro o nome do time e logo em seguida o nome do jogador. Mas, naquele gol, fiz uma pequena pausa antes de falar o nome do Pet. Isso acabou deixando o ritmo um pouco diferente e ficou só a torcida de fundo. Ao longo dos anos essa narração foi muito acessada no Youtube e, se não me engano, o vídeo na internet começa comigo falando “reza Alessandro”. E durante muito tempo as pessoas paravam ao meu lado e diziam “reza Alessandro” e “que golaço do Pet”. Mas eu não me lembrava da minha narração e não associava uma coisa a outra. Um dia resolvi perguntar e a pessoa me explicou que estava repetindo a forma como narrei aquele gol.
José Carlos Araújo, da Rádio Globo: 'Nessa hora a gente extravasa, extrapola'
- Eu me lembro do Pet colocando a bola no ângulo esquerdo, o Helton ainda tocando na bola... Por ser quase no fim, a expectativa é maior do que se fosse no início de um tempo, e ficou marcado por isso. Não era como o gol mil do Pelé, que o Waldir Amaral se preparou para narrar. Foi um negócio surpreendente, podia dar tanto para um lado como para o outro. Nessa hora a gente extravasa, extrapola... É o que a torcida espera da gente nesse momento. A torcida que conduz a transmissão. Mas naquele momento você não está torcendo, você é apenas um instrumento para transmitir a emoção do lance. (Os últimos minutos) eram praticamente de ovação, comemoração... Como se já tivesse acabado naquele momento (da falta).
Confira o infográfico com detalhes do gol de falta de Petkovic:
FONTE GLOBO ESPORTE.COM
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26/05/2011 15h45 - Atualizado em 26/05/2011 17h04
Pet 10 anos: 'Muitos craques não têm um momento como aquele gol'
Do abandono da concentração à curva da bola, sérvio relembra emoções de 2001. Camisa 10 também fala sobre despedida e planos de ser técnico
Petkovic ironiza quem atribui à sorte seu histórico gol de falta há dez anos. O jogador deixou o frio da antiga Iugoslávia para trás, passou pela Europa, chegou ao Brasil e defendeu o Vitória. Mas foi em outro Rubro-Negro que sua vida mudou para sempre. O marco foi o dia 27 de maio de 2001. O Maracanã como palco. No roteiro, superação e emoção até o fim. No estádio, milhares de testemunhas viram o Flamengo conquistar o tricampeonato com uma cobrança mágica de longe, aos 43 do segundo tempo.
Para Pet, não apenas testemunhas, mas também responsáveis por dar direção à curva que a bola fez para entrar no espaço possível entre os dedos de Helton e a trave.
- A bola tomou aquela energia por conta da vibração da torcida, pois todo mundo acreditou no gol naquele momento. Acho que os torcedores levaram a bola para aquele ângulo – declarou Petkovic.
- Pouco depois tive de fazer outro, para mostrar que não foi sorte.
Pet vive um carrossel de emoções. Na noite desta quinta-feira, lançará no Brasil o documentário "O Gringo", sobre sua vida; na sexta, a data marcante dos 10 anos do gol de falta; e no próximo dia 5, contra o Corinthians, no Engenhão, sua despedida oficial do Flamengo.
- Essa torcida merece.
Você disse que já assistiu ao teipe do gol de falta milhões de vezes. O que enxerga de diferente a cada vez que recorda o lance?
Você não reage sempre da mesma maneira. Depende de quantas vezes assisto, em que momento, onde estou vendo, quem está te mostrando. Um dia desses, vi três vezes, pois pessoas na rua mostraram para mim no celular. Aí, é diferente. Isso acontece quase todo dia, o torcedor do Flamengo mostra a todo instante e agradece. Existem várias cópias e edições que fizeram... A torcida, a narração, realmente fazem voltar lembranças. Dez anos se passaram, mas parece que aconteceu ontem. A torcida vive como se fosse uma coisa recente. Vai ficar por um longo período na história. Arrepia até hoje, mesmo anos e anos depois.
E qual a lembrança mais forte do dia 27 de maio de 2001?
Não tem apenas uma lembrança. Foi uma coisa muito marcante, cheia de emoções que nos preencheram de maneiras diferentes. Posteriormente, pude perceber que aquele momento foi uma erupção de emoções. Mas durante o jogo, depois do gol de falta e da alegria, você fica com medo, vem a tremedeira. A partida não acaba, se o Vasco fizer um gol acaba com tudo isso, não pode acontecer. Eu quis fazer o gol, tenho competência, treinei... Mas a importância daquele gol só veio depois, quando percebi o que significou na minha vida e na de tantas famílias. Sempre encontro alguém que conta uma história, não imaginava o que eles viveram naquele momento. Pude ver como o futebol mexe com a cabeça, as emoções e a vida das pessoas. Sou muito afortunado por ter sido o principal causador de uma coisa tão importante e com tantas emoções diretamente na vida de tantos torcedores do Flamengo.
O que passou pela sua cabeça antes e no momento exato da cobrança da falta?
Lembro da minha concentração na hora da falta, o pensamento de que é agora ou nunca. Imaginei a trajetória da bola, por onde ela tinha que passar. Depois, a erupção, a corrida, minha caída de costas na comemoração. Foi um tombo forte, fiquei dolorido durante uma semana. Depois, vem a lembrança de como foi minha atuação na partida, muitas coisas, o que antecedeu e o que aconteceu depois. Muitos craques e jogadores melhores tiveram uma carreira grandiosa, fizeram muitos jogos bons, conquistaram títulos, mas não têm um momento que podem destacar. Tenho alguns momentos desses, que foram um trampolim. O gol de falta foi na metade da minha carreira, e fez um ponto importante, que pulou para cima. Talvez isso diferencie minha carreira da de outros craques. Esse momento poucos tiveram.
Como aquela bola entrou?
Bati como tinha que bater na bola, de cima para baixo, levantei, ela fez uma curva num ângulo muito bom. Estava um pouco longe. Normalmente, daquela distância, o jogador bate mais forte, dá uma pancada. Bati como se fosse mais perto. Ela tomou aquela energia por conta da vibração da torcida, pois todo mundo acreditou no gol naquele momento, e acho que levaram a bola para aquele ângulo, para tocar nos dedinhos da luva do Helton e dar aquela alegria para todos nós.
Você consegue imaginar como seria sua vida se aquela bola não tivesse entrado?
O talvez não existe. Tem o que acontece ou não. Não penso nisso. Não penso o que faria se não fosse jogador, por exemplo. Aceito meu destino, aquilo que Deus pensou quando plantou minha semente. Tento realizar tudo com muito esforço, dedicação. A única coisa que sempre pedi a Deus foi ter força para realizar o que foi pensado para mim. Deus me guiou bem, eu soube aproveitar da melhor maneira, mesmo tendo perdido algumas coisas e errado em outras.
Quase que você ficou fora do segundo jogo da decisão. Como foi essa história, a polêmica e a importância do seu amigo Wilsão, que fez com que você mudasse de ideia?
Foi na sexta-feira, dia 25 de maio. Aconteceu um episódio antes mesmo da primeira partida, quando fiz um gol na derrota por 2 a 1. O Flamengo tinha problemas financeiros, que já naquela época não eram novos, eram comuns. Mas existiam promessas sempre antes de jogos decisivos e importantes. O clube fazia isso para deixar os jogadores mais tranquilos. Tinham prometido efetuar alguns pagamentos e não fizeram. Fomos para o primeiro jogo, a diretoria disse que pagaria na segunda-feira. Todo mundo acreditou, ficamos um pouco mais tranquilos, apesar de estarmos há meses sem receber. Na terça-feira, depois da primeira partida, pagaram todo mundo, menos a mim. Fui perguntar o que aconteceu e os dirigentes disseram: "Ah, para você devemos oito meses, para os outros três, quatro, então decidimos que é justo pagar dois meses de atraso. Vamos pagar na quinta". Muito bom, naquele momento era a primeira coisa, digamos, boa, gentil, lógica que escutei. Chegou quinta e não aconteceu. Eles falaram que seria no dia seguinte. Na sexta, disseram que seria na outra semana. Aí vi que era mentira. Fiquei chateado, apelei mesmo, briguei com eles e fui embora para casa, não fui para concentração. Liguei para o meu amigo (Wilsão), falei que não ia jogar. Ele tentou me convencer, ficamos juntos até meia-noite, quando ele conseguiu me convencer que estava jogando pela torcida, que os dirigentes eram passageiros. O Wilsão me disse para depois do jogo explicar para todo mundo, ir embora, mas conversou comigo, falou: "Sem você nossas chances diminuem ainda mais". Falei "tá bom". Fui para concentração, cheguei ao restaurante por volta de 0h30m, estava toda cúpula do futebol. Sem falar com eles, sentei numa mesa. O gerente de futebol (Chimello) veio falar comigo e perguntou: "Parceiro, estamos dentro?". Respondi: "sS não estivesse, eu viria para cá?!". Ele pediu desculpas e falou: "Está com fome, quer jantar?". Eu disse: "Não vim aqui falar com vocês, lógico que quero jantar". Ele pediu para sentar, deixei, mas avisei que os outros nem deveriam se aproximar. Jantei e fui dormir.
Como foi a reação do grupo?
No dia seguinte, sem falar com ninguém, fui treinar. Zagallo entendeu toda situação. Se não fosse a experiência dele, poderia simplesmente jogar a culpa no jogador. Mas ele achava que eu era importante para o time, perguntou se eu queria jogar e eu disse: "Claro". "Então vamos para dentro. Sei que você fará o melhor possível", o Zagallo respondeu. O Maurinho, meu parceiro de quarto, estava preocupado, me ligou um milhão de vezes: "Estava onde, está maluco?". "Tô, mas eu vim". Todos os companheiros entenderam, pois eles estavam chateados. O Julio César falou: "Vamos lá, depois a gente quebra com eles". Descansei bem, fui para o jogo e deu no que deu. Fomos campeões, aí não tinha como, eles tinham que pagar o dinheiro que deviam. Depois arrumaram dinheiro, não sei se foi com patrocinador. E passaram o cheque com fundos, mas porque não era do Flamengo, mas sim do patrocinador.
E os seus problemas com o Edílson?
(Muda o semblante e interrompe). Não tinha problema com Edílson, foi depois...
Então, o que você acha de o Edílson ter declarado que gostaria que aquela falta tivesse batido na trave e sobrado para ele, que faria seu terceiro gol na partida?
(Risos). É brincadeira dele. Edílson foi muito bom jogador, ajudou o Flamengo, foi artilheiro. Eu fiz muitas assistências para ele. Acho que coloquei o Edílson na Seleção naquela época. Não só ele como o Juan. Dos gols que o Edílson fez, 90% das assistências foram minhas. Juan também ia de cabeça nos escanteios, dei muitos passes. Tínhamos um time muito bom. Depois, logicamente, Edílson tinha brigado com um e com outro, teve a discussão comigo... Só que comigo toma dimensão maior do que com os demais. Ele já tinha brigado com outros jogadores de menor expressão. Mas se brigam dois jogadores mais importantes, os craques do time, todos querem se meter. Mesmo com toda essa discussão, no dia seguinte, já dava passes para fazer gols. Meu lema é o time. Vou dar o passe para ele, mas não preciso falar, posso brigar, acontece. Você briga com seu amigo, imagina com um colega de trabalho. Depois, isso foi superado. Ganhamos o Carioca, a Copa dos Campeões. Ganharíamos a Mercosul, mas a final foi adiada por conta de problemas na Argentina. O jogo foi marcado para janeiro, depois das férias, fomos despreparados. Edílson não jogou, pois tinha sido expulso na partida anterior. Ele era bom jogador, independentemente de qualquer coisa, importante para o time.
Pouco depois do tri, você marcou um gol muito semelhante na final da Copa dos Campeões contra o São Paulo, e o Flamengo acabou sendo campeão novamente.
Foi praticamente idêntico, mas nem gêmeos são idênticos. Mas aquele gol foi praticamente igual, muito semelhante: posição, chute, ângulo, a curva na bola. Diferente foram o time e o goleiro. Antes disso, já tinha marcado uns três, quatro gols da mesma maneira. Ninguém lembra porque não era uma final, não tinha a mesma importância. Fiz contra o Fluminense, Guarani, Juventude, Gama. Para mostrar que não era sorte, tive que fazer outro para mostrar isso. E foi contra um grande time que era o São Paulo, com Rogério Ceni, um grande goleiro. Mostra minha competência nas batidas de falta. Hoje, podemos dizer que não foi sorte.
Mas, na final contra o Vasco, você teve outras três cobranças de falta que nem passaram perto do gol...
Lembro de uma que foi para fora, outra que bateu na barreira. Mas essa da barreira ia no gol. Quando chutei, falei "vai". Mas acho que o Torres tirou de cabeça. A última era mais longe. E entrou.
Você guarda o uniforme daquele jogo?
A camisa e a chuteira, sim, ficam num pequeno museu em casa. O resto roubaram tudo no vestiário, meião, calção...
E como nasceu sua identificação com o número 10?
Vem desde criança. Sempre usei, desde as divisões de base do meu país. Quando eu não usei a 10 eu quase não fui bem. Quando não queriam me dar. Cheguei ao Real Madrid já tinha o 10, pois lá era numeração fixa, como é aqui no Brasil agora. Aí quebrei o pé no Real. No Fluminense, usei o número 8 no primeiro ano, mas joguei bem. O Felipe já era o camisa 10, aí me ofereceram a 8. Respeitei a situação.
Mas no Flamengo a mística da camisa 10 é ainda maior.
Você acha que consegue fazer um golzinho de falta na sua despedida?
Não penso sobre isso, penso que será um grande jogo contra o Corinthians, à vera, gostaria de conquistar os três pontos. Imagino que será um belo espetáculo, um bom dia, ficarei feliz, mas independentemente da minha atuação, a torcida terá oportunidade de me ver pela última vez como jogador profissional. Vou me despedir, essa torcida merece. Sempre me deram muito carinho e apoio. Ultimamente, disse que jogava pela torcida. Eles queriam que eu jogasse mais, eu também queria, mas infelizmente não deu.
E depois de encerrada a carreira como jogador, qual será o futuro do Pet?
Vou continuar com a minha vida profissional no futebol. Tenho contrato com o Flamengo, tenho que honrar meu compromisso. Vou ajudar e contribuir com que eles acharem bom eu fazer. Quando acabar, vou ser técnico.
Como será o Pet técnico? ‘Chato’ como foi o jogador?
Essas coisas mudam com o tempo, com a experiência. Não sei se vocês concordam, mas estou mais controlado, antes era mais nervoso, mais marrento, pois queria o resultado melhor para o time. Aprendi muito nesses anos. A gente muda. Mais novo, a gente olha muito para si, e depois para a instituição. De alguns anos para cá, coloquei o grupo em primeiro lugar. Quando você cobra, muitas vezes tem que engolir ou explicar. É preciso aprender a lidar com colegas, profissionais. Somos todos iguais, mas nem todos reagem às críticas e elogios da mesma maneira. Aprendi muito com meus técnicos. Quem me conhece acha que tenho competência e perfil para ser técnico. Vou tentar retribuir tudo que o futebol me deu. Os garotos poderão se espelhar no exemplo que eu fui, minha trajetória, dedicação profissional. Quero mostrar uma visão diferente e moderna do futebol. A experiência de vestiário conta muito numa carreira de 23 anos como profissional. Como sou um cara inteligente e consegui enganar todo mundo, acho que vou continuar enganando.
Como o Pet treinador reagiria se na sexta-feira à noite antes de uma decisão um jogador não aparecesse na concentração?
Essa coisa aconteceu em 2001, quando o presidente era Edmundo dos Santos Silva. Tivemos problemas disciplinares por causa da insatisfação. Na época, eles perguntavam o que deveriam fazer. Como vou cobrar se estou devendo? Se não pago há mais de dois meses, não posso mandar embora, não posso punir, pois o jogador tem direito de não aparecer. Disse para o Edmundo perguntar quem não estava satisfeito. Garanti que ninguém iria se pronunciar. Quem estivesse insatisfeito, que saísse. Quem não estivesse, ficaria no compromisso. Então, a diretoria bateria o punho na mesa, dizendo que eles deveriam ser profissionais, como se estivessem com salários em dia e fossem os mais bem pagos do mundo. Os dirigentes fizeram exatamente isso, ninguém falou nada, e nos salvamos do rebaixamento em 2001.
Quando você voltou, em 2009, poucos apostaram que poderia dar certo. Como superou a rejeição inicial?
Eu acreditava, e isso era o que importava. E falei isso na época. Minha volta começou com duas pessoas, passou para quatro, seis, oito, dez... Aumentava porque cada um tinha sua visão. No final, todo mundo veio no mesmo entendimento. Conseguimos um acordo que era muito bom para o Flamengo, bom para torcida, que queria que eu voltasse, bom para mim. Fiz praticamente de tudo para que minha volta acontecesse. "Vou voltar, vou ser o melhor jogador e vamos ganhar títulos", eu disse. Falavam que eu estava dizendo isso da boca para fora. Eu disse que não, que via a equipe, que faltava uma peça como eu, que estava muito bem fisicamente, com vontade enorme de jogar. Meu irmão me perguntou como eu aturava tudo aquilo, que era humilhação, um cara lá não te quer. Humilhação não é. Um não me quer, mas a torcida, sim. Sabia que poderia ser importante, mesmo que só nos treinamentos para ensinar os mais jovens. Eu voltei, estava feliz todo dia, mesmo sem jogar, no banco, sem entrar... Liberei o Flamengo de penhoras, com esse dinheiro poderiam pagar outros jogadores. Comecei a receber só em 2010, fiz esse acordo também. Ajudava pra caramba o clube. Meu empresário disse: ‘Vamos pensar na pior hipótese: e se você for lá e não jogar nenhum minuto?" Respondi: "Pode acontecer. Estou preparado para isso, mas essa não é a pior hipótese. Pior é se eu não jogar bem. Mas essa hipótese não existe: Vou jogar bem". A energia que levou aquela bola em 2001 levou o time dessa vez. Deu certo.
Para Pet, não apenas testemunhas, mas também responsáveis por dar direção à curva que a bola fez para entrar no espaço possível entre os dedos de Helton e a trave.
- A bola tomou aquela energia por conta da vibração da torcida, pois todo mundo acreditou no gol naquele momento. Acho que os torcedores levaram a bola para aquele ângulo – declarou Petkovic.
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O sérvio lembra as promessas não cumpridas pela diretoria dos pagamentos de salários atrasados, o abandono da concentração às vésperas da decisão, a mística da camisa 10 de Zico, e a semelhança do gol com o da final da Copa dos Campeões, contra o São Paulo.- Pouco depois tive de fazer outro, para mostrar que não foi sorte.
Pet está rindo à toa com as emoções desta agitada semana (Foto: André Durão / GLOBOESPORTE.COM)
Pet vive um carrossel de emoções. Na noite desta quinta-feira, lançará no Brasil o documentário "O Gringo", sobre sua vida; na sexta, a data marcante dos 10 anos do gol de falta; e no próximo dia 5, contra o Corinthians, no Engenhão, sua despedida oficial do Flamengo.
- Essa torcida merece.
Você disse que já assistiu ao teipe do gol de falta milhões de vezes. O que enxerga de diferente a cada vez que recorda o lance?
Você não reage sempre da mesma maneira. Depende de quantas vezes assisto, em que momento, onde estou vendo, quem está te mostrando. Um dia desses, vi três vezes, pois pessoas na rua mostraram para mim no celular. Aí, é diferente. Isso acontece quase todo dia, o torcedor do Flamengo mostra a todo instante e agradece. Existem várias cópias e edições que fizeram... A torcida, a narração, realmente fazem voltar lembranças. Dez anos se passaram, mas parece que aconteceu ontem. A torcida vive como se fosse uma coisa recente. Vai ficar por um longo período na história. Arrepia até hoje, mesmo anos e anos depois.
E qual a lembrança mais forte do dia 27 de maio de 2001?
Não tem apenas uma lembrança. Foi uma coisa muito marcante, cheia de emoções que nos preencheram de maneiras diferentes. Posteriormente, pude perceber que aquele momento foi uma erupção de emoções. Mas durante o jogo, depois do gol de falta e da alegria, você fica com medo, vem a tremedeira. A partida não acaba, se o Vasco fizer um gol acaba com tudo isso, não pode acontecer. Eu quis fazer o gol, tenho competência, treinei... Mas a importância daquele gol só veio depois, quando percebi o que significou na minha vida e na de tantas famílias. Sempre encontro alguém que conta uma história, não imaginava o que eles viveram naquele momento. Pude ver como o futebol mexe com a cabeça, as emoções e a vida das pessoas. Sou muito afortunado por ter sido o principal causador de uma coisa tão importante e com tantas emoções diretamente na vida de tantos torcedores do Flamengo.
O que passou pela sua cabeça antes e no momento exato da cobrança da falta?
Helton passou perto, mas não conseguiu evitar a festa rubro-negra (Foto: Hipólito Pereira / O Globo)
Lembro da minha concentração na hora da falta, o pensamento de que é agora ou nunca. Imaginei a trajetória da bola, por onde ela tinha que passar. Depois, a erupção, a corrida, minha caída de costas na comemoração. Foi um tombo forte, fiquei dolorido durante uma semana. Depois, vem a lembrança de como foi minha atuação na partida, muitas coisas, o que antecedeu e o que aconteceu depois. Muitos craques e jogadores melhores tiveram uma carreira grandiosa, fizeram muitos jogos bons, conquistaram títulos, mas não têm um momento que podem destacar. Tenho alguns momentos desses, que foram um trampolim. O gol de falta foi na metade da minha carreira, e fez um ponto importante, que pulou para cima. Talvez isso diferencie minha carreira da de outros craques. Esse momento poucos tiveram.
Como aquela bola entrou?
Bati como tinha que bater na bola, de cima para baixo, levantei, ela fez uma curva num ângulo muito bom. Estava um pouco longe. Normalmente, daquela distância, o jogador bate mais forte, dá uma pancada. Bati como se fosse mais perto. Ela tomou aquela energia por conta da vibração da torcida, pois todo mundo acreditou no gol naquele momento, e acho que levaram a bola para aquele ângulo, para tocar nos dedinhos da luva do Helton e dar aquela alegria para todos nós.
Você consegue imaginar como seria sua vida se aquela bola não tivesse entrado?
O talvez não existe. Tem o que acontece ou não. Não penso nisso. Não penso o que faria se não fosse jogador, por exemplo. Aceito meu destino, aquilo que Deus pensou quando plantou minha semente. Tento realizar tudo com muito esforço, dedicação. A única coisa que sempre pedi a Deus foi ter força para realizar o que foi pensado para mim. Deus me guiou bem, eu soube aproveitar da melhor maneira, mesmo tendo perdido algumas coisas e errado em outras.
Quase que você ficou fora do segundo jogo da decisão. Como foi essa história, a polêmica e a importância do seu amigo Wilsão, que fez com que você mudasse de ideia?
Depois do primeiro jogo da final, pagaram a todos, menos a mim. Disseram que, como me deviam oito meses, eu receberia dois de uma vez só. Foi a primeira coisa gentil que eu ouvi. Depois, vi que era mentira. Fiquei chateado, apelei mesmo"
Como foi a reação do grupo?
No dia seguinte, sem falar com ninguém, fui treinar. Zagallo entendeu toda situação. Se não fosse a experiência dele, poderia simplesmente jogar a culpa no jogador. Mas ele achava que eu era importante para o time, perguntou se eu queria jogar e eu disse: "Claro". "Então vamos para dentro. Sei que você fará o melhor possível", o Zagallo respondeu. O Maurinho, meu parceiro de quarto, estava preocupado, me ligou um milhão de vezes: "Estava onde, está maluco?". "Tô, mas eu vim". Todos os companheiros entenderam, pois eles estavam chateados. O Julio César falou: "Vamos lá, depois a gente quebra com eles". Descansei bem, fui para o jogo e deu no que deu. Fomos campeões, aí não tinha como, eles tinham que pagar o dinheiro que deviam. Depois arrumaram dinheiro, não sei se foi com patrocinador. E passaram o cheque com fundos, mas porque não era do Flamengo, mas sim do patrocinador.
E os seus problemas com o Edílson?
(Muda o semblante e interrompe). Não tinha problema com Edílson, foi depois...
Então, o que você acha de o Edílson ter declarado que gostaria que aquela falta tivesse batido na trave e sobrado para ele, que faria seu terceiro gol na partida?
(Risos). É brincadeira dele. Edílson foi muito bom jogador, ajudou o Flamengo, foi artilheiro. Eu fiz muitas assistências para ele. Acho que coloquei o Edílson na Seleção naquela época. Não só ele como o Juan. Dos gols que o Edílson fez, 90% das assistências foram minhas. Juan também ia de cabeça nos escanteios, dei muitos passes. Tínhamos um time muito bom. Depois, logicamente, Edílson tinha brigado com um e com outro, teve a discussão comigo... Só que comigo toma dimensão maior do que com os demais. Ele já tinha brigado com outros jogadores de menor expressão. Mas se brigam dois jogadores mais importantes, os craques do time, todos querem se meter. Mesmo com toda essa discussão, no dia seguinte, já dava passes para fazer gols. Meu lema é o time. Vou dar o passe para ele, mas não preciso falar, posso brigar, acontece. Você briga com seu amigo, imagina com um colega de trabalho. Depois, isso foi superado. Ganhamos o Carioca, a Copa dos Campeões. Ganharíamos a Mercosul, mas a final foi adiada por conta de problemas na Argentina. O jogo foi marcado para janeiro, depois das férias, fomos despreparados. Edílson não jogou, pois tinha sido expulso na partida anterior. Ele era bom jogador, independentemente de qualquer coisa, importante para o time.
Pouco depois do tri, você marcou um gol muito semelhante na final da Copa dos Campeões contra o São Paulo, e o Flamengo acabou sendo campeão novamente.
Foi praticamente idêntico, mas nem gêmeos são idênticos. Mas aquele gol foi praticamente igual, muito semelhante: posição, chute, ângulo, a curva na bola. Diferente foram o time e o goleiro. Antes disso, já tinha marcado uns três, quatro gols da mesma maneira. Ninguém lembra porque não era uma final, não tinha a mesma importância. Fiz contra o Fluminense, Guarani, Juventude, Gama. Para mostrar que não era sorte, tive que fazer outro para mostrar isso. E foi contra um grande time que era o São Paulo, com Rogério Ceni, um grande goleiro. Mostra minha competência nas batidas de falta. Hoje, podemos dizer que não foi sorte.
Mas, na final contra o Vasco, você teve outras três cobranças de falta que nem passaram perto do gol...
Lembro de uma que foi para fora, outra que bateu na barreira. Mas essa da barreira ia no gol. Quando chutei, falei "vai". Mas acho que o Torres tirou de cabeça. A última era mais longe. E entrou.
Você guarda o uniforme daquele jogo?
A camisa e a chuteira, sim, ficam num pequeno museu em casa. O resto roubaram tudo no vestiário, meião, calção...
E como nasceu sua identificação com o número 10?
Vem desde criança. Sempre usei, desde as divisões de base do meu país. Quando eu não usei a 10 eu quase não fui bem. Quando não queriam me dar. Cheguei ao Real Madrid já tinha o 10, pois lá era numeração fixa, como é aqui no Brasil agora. Aí quebrei o pé no Real. No Fluminense, usei o número 8 no primeiro ano, mas joguei bem. O Felipe já era o camisa 10, aí me ofereceram a 8. Respeitei a situação.
Mas no Flamengo a mística da camisa 10 é ainda maior.
Pet acha que será bom técnico: 'engano todo mundo'
(Foto: André Durão / GLOBOESPORTE.COM)
Quando cheguei ao clube, em 2000, não imaginava o tamanho da encrenca em que eu estava me metendo com a camisa 10, do Flamengo e de Zico. O Zico era meu ídolo, mas eu não sabia da importância, dos gols, do significado grande que ele tinha. Aceitei isso. Quando comecei a entender, conheci a história. Minha preocupação foi a de não sujar e honrar esta camisa. Fiquei feliz quando fizeram as comparações com o Zico, uma honra. Mas jornalistas e torcida às vezes exageram e criticam demais. Mas, depois de tanto tempo, essa identificação com a camisa é muito gratificante. Agradeci publicamente ao Zico por tudo de bom que falou de mim.(Foto: André Durão / GLOBOESPORTE.COM)
Você acha que consegue fazer um golzinho de falta na sua despedida?
Não penso sobre isso, penso que será um grande jogo contra o Corinthians, à vera, gostaria de conquistar os três pontos. Imagino que será um belo espetáculo, um bom dia, ficarei feliz, mas independentemente da minha atuação, a torcida terá oportunidade de me ver pela última vez como jogador profissional. Vou me despedir, essa torcida merece. Sempre me deram muito carinho e apoio. Ultimamente, disse que jogava pela torcida. Eles queriam que eu jogasse mais, eu também queria, mas infelizmente não deu.
E depois de encerrada a carreira como jogador, qual será o futuro do Pet?
Vou continuar com a minha vida profissional no futebol. Tenho contrato com o Flamengo, tenho que honrar meu compromisso. Vou ajudar e contribuir com que eles acharem bom eu fazer. Quando acabar, vou ser técnico.
Como será o Pet técnico? ‘Chato’ como foi o jogador?
Essas coisas mudam com o tempo, com a experiência. Não sei se vocês concordam, mas estou mais controlado, antes era mais nervoso, mais marrento, pois queria o resultado melhor para o time. Aprendi muito nesses anos. A gente muda. Mais novo, a gente olha muito para si, e depois para a instituição. De alguns anos para cá, coloquei o grupo em primeiro lugar. Quando você cobra, muitas vezes tem que engolir ou explicar. É preciso aprender a lidar com colegas, profissionais. Somos todos iguais, mas nem todos reagem às críticas e elogios da mesma maneira. Aprendi muito com meus técnicos. Quem me conhece acha que tenho competência e perfil para ser técnico. Vou tentar retribuir tudo que o futebol me deu. Os garotos poderão se espelhar no exemplo que eu fui, minha trajetória, dedicação profissional. Quero mostrar uma visão diferente e moderna do futebol. A experiência de vestiário conta muito numa carreira de 23 anos como profissional. Como sou um cara inteligente e consegui enganar todo mundo, acho que vou continuar enganando.
Como o Pet treinador reagiria se na sexta-feira à noite antes de uma decisão um jogador não aparecesse na concentração?
Essa coisa aconteceu em 2001, quando o presidente era Edmundo dos Santos Silva. Tivemos problemas disciplinares por causa da insatisfação. Na época, eles perguntavam o que deveriam fazer. Como vou cobrar se estou devendo? Se não pago há mais de dois meses, não posso mandar embora, não posso punir, pois o jogador tem direito de não aparecer. Disse para o Edmundo perguntar quem não estava satisfeito. Garanti que ninguém iria se pronunciar. Quem estivesse insatisfeito, que saísse. Quem não estivesse, ficaria no compromisso. Então, a diretoria bateria o punho na mesa, dizendo que eles deveriam ser profissionais, como se estivessem com salários em dia e fossem os mais bem pagos do mundo. Os dirigentes fizeram exatamente isso, ninguém falou nada, e nos salvamos do rebaixamento em 2001.
Quando você voltou, em 2009, poucos apostaram que poderia dar certo. Como superou a rejeição inicial?
Eu acreditava, e isso era o que importava. E falei isso na época. Minha volta começou com duas pessoas, passou para quatro, seis, oito, dez... Aumentava porque cada um tinha sua visão. No final, todo mundo veio no mesmo entendimento. Conseguimos um acordo que era muito bom para o Flamengo, bom para torcida, que queria que eu voltasse, bom para mim. Fiz praticamente de tudo para que minha volta acontecesse. "Vou voltar, vou ser o melhor jogador e vamos ganhar títulos", eu disse. Falavam que eu estava dizendo isso da boca para fora. Eu disse que não, que via a equipe, que faltava uma peça como eu, que estava muito bem fisicamente, com vontade enorme de jogar. Meu irmão me perguntou como eu aturava tudo aquilo, que era humilhação, um cara lá não te quer. Humilhação não é. Um não me quer, mas a torcida, sim. Sabia que poderia ser importante, mesmo que só nos treinamentos para ensinar os mais jovens. Eu voltei, estava feliz todo dia, mesmo sem jogar, no banco, sem entrar... Liberei o Flamengo de penhoras, com esse dinheiro poderiam pagar outros jogadores. Comecei a receber só em 2010, fiz esse acordo também. Ajudava pra caramba o clube. Meu empresário disse: ‘Vamos pensar na pior hipótese: e se você for lá e não jogar nenhum minuto?" Respondi: "Pode acontecer. Estou preparado para isso, mas essa não é a pior hipótese. Pior é se eu não jogar bem. Mas essa hipótese não existe: Vou jogar bem". A energia que levou aquela bola em 2001 levou o time dessa vez. Deu certo.
FONTE GLOBO ESPORTE.COM
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Zagallo: 'O tri com o gol do Pet foi uma verdadeira Copa do Mundo’
Velho Lobo se emociona ao lembrar falta cobrada pelo gringo em 2001 e diz que título apagou parte da dor pelo vice da Seleção em 1950, no Maracanã
Zagallo revê o lance do gol. Durante a trajetória da bola na falta cobrada por Pet, os olhos se enchem de lágrimas, a voz embarga e o Velho Lobo mostra os pelos do braço arrepiados. Dez anos se passaram desde o histórico gol marcado aos 43 minutos do segundo tempo, a vitória por 3 a 1 sobre o Vasco no dia 27 de maio de 2001, e o tricampeonato estadual. Em vez de apagar, o tempo alimentou de emoção a cada dia, mês e ano a memória do ex-técnico rubro-negro.
Com um currículo vitorioso, Zagallo ainda tinha uma dose de emoção guardada para a reta final de sua carreira como técnico. E bem no final, aos 43 minutos do segundo tempo, na sua última conquista no Maracanã. Naquele 27 de maio de 2001, agarrado à sua imagem de Santo Antônio, o Velho Lobo só tinha um pedido:
- Era fração de segundos para ganhar o título. Com a torcida, a fé, a imagem de Santo Antônio na minha mão, pensei: "É, vai ser agora, vai ser mesmo’. E não deu outra. Deus me abençoou, iluminou a mim e ao Pet.
Dia 27 de maio de 2001. Dez anos se passaram. Nesta data, o senhor também vai relembrar tudo que aconteceu no Maracanã? Mesmo tanto tempo depois, ainda arrepia?
Você falou no arrepio e ele já veio (mostra os pelos do braço arrepiados). Veio porque é deslumbrante. Você conviver, viver aquilo que aconteceu em 2001. Estamos em 2011, lembro os detalhes como um filme que passa a toda hora, todo instante, todo momento. Estou falando aqui e vejo o Pet colocar a bola no gramado, se preparar para chutar. E eu torcendo como nunca para que ela entrasse. Só com o Pet, que chutava muito bem, aquela bola poderia conseguir o impossível. O impossível aconteceu: a bola colocada no ângulo, fora do alcance do Helton, que hoje está em Portugal fazendo milagres. Mas o milagroso dessa falta foi o chute determinado, imposto pela sua categoria e a vontade de que aquele terceiro gol entrasse naquele ângulo. Deus quis que o título, aquele jogo, aquele gol mostrassem a realidade de um jogador fabuloso que foi o Pet, fazendo o terceiro gol para vibrar sozinho, depois com todos os jogadores e com a majestade da torcida maravilhosa que é a do Flamengo. Naquele dia, tudo era ansiedade, desde a concentração, a subida no ônibus, o caminho para o Maracanã, a imensa torcida ao lado do ônibus gritando "Mengo, Mengo, vamos ganhar". São memórias que ficam e jamais sairão da minha retina.
A conquista do tricampeonato sobre o Vasco, da forma como foi, teve o mesmo gosto de uma Copa do Mundo?
Às vezes, até mais. Naquele tricampeonato, eu estava dentro do meu país, no Maracanã, onde tive uma decepção tremenda. Como soldado da polícia do exército, estava no Maracanã e vi o Brasil perder para o Uruguai a final da Copa de 1950. Nesse mesmo estádio, repleto de uma torcida inflamada como a do Flamengo, o tricampeonato com o gol do Pet foi uma verdadeira Copa do Mundo. Por exemplo: em 1970, foi sensacional, meu terceiro título mundial, o primeiro como técnico da Seleção Brasileira. Estava no México, o mundo passava através da minha cabeça, pensava no Brasil, no Maracanã. No tricampeonato pelo Flamengo, eu estava no Maracanã com a torcida preta e vermelha toda gritando "Mengo, Mengo, Mengo". Não é fácil.
Naquela decisão, além da superação dentro de campo, foi preciso vencer uma série de problemas internos, rixa entre Pet e Edílson. Como o senhor fez para unir o grupo na busca pelo título, ainda mais depois da derrota por 2 a 1 na primeira partida da final?
Quem vê uma vitória final não sabe o que passamos durante a competição em 2001. Houve problemas internos, todos sabiam que o Pet e Edílson não se davam, aconteceram várias reuniões: eu com o grupo, o elenco sozinho para falar sobre o assunto, pois já estava quase na véspera do jogo e nós estávamos abordando o caso. Disse que tínhamos que trabalhar, nos unir, pois dentro de campo o que vale é o preto e vermelho, a união. Se fora de campo eles (Pet e Edílson) não se davam, era outra questão. Dentro do jogo, a coisa tinha que ser diferente. E realmente foi. Levamos os problemas a um bom senso, de fato os jogadores se uniram e fomos para o Maracanã com um único objetivo: ganhar o tricampeonato. E conseguimos, com sangue, suor e lágrimas.
E o Edílson marcou dois gols, um deles de cabeça depois de passe do Pet, e também sofreu a falta que originou no gol do título...
Sim. O Edílson fez um gol de cabeça com um passe do Pet. Eles estavam ligadões, pensando só no jogo, na vitória, não pensavam mais nos problemas extracampo. Isso foi fundamental para o trabalho do grupo pela vitória.
Hoje, qualquer telefone celular tira foto. Quando o torcedor fala comigo, cita o gol do Pet, comemora, diz que tem que agradecer a vida toda por aquela conquista. Apesar de o tempo ter passado, eles querem uma foto comigo. E lembram também a frase "vocês vão ter que me engolir". Sou querido pelo povo brasileiro.
Hoje, quando o senhor lembra do título, a emoção ainda é visível. Como é essa ligação com o clube, o tricampeonato, a paixão rubro-negra?
O Flamengo marcou minha vida. Jogava no juvenil do América em 48 e 49, depois fui para o exército. Lá tinha um jogador, o lateral Gerson, que era do juvenil do Flamengo e que me fez o convite para ir até o clube. No América, nunca tinha recebido dinheiro, era um sócio-contribuinte, meu pai pagava 20 mil réis para eu jogar vôlei, pingue-pongue, fazer natação e futebol. Eu pagava para jogar. O Jaime de Almeida, que era o técnico do Flamengo na época, gostou, e fizeram minha transferência para o Flamengo usando como ponte o Canto do Rio. Foi uma nova vida futebolística. Como jogador, fui tricampeão pelo Flamengo em 1953, 54, 55, já tinha raízes. Depois, a vida continuou, retornei ao Flamengo e encerrei minha carreira como técnico no clube. No final da minha vida, tive uma alegria como a de 2001. Foi uma felicidade total. Depois de ser tri como jogador, Deus me proporcionou estar no tricampeonato como treinador.
Podemos dizer que o Pet ajudou nesse desfecho com chave de ouro? O que pode falar dele como jogador e pessoa?
Falar sobre o Pet é importante na minha vida, pelo convívio que tive nesse período, na conquista do tricampeonato. Ele era um jogador difícil. O treinador tinha que ter um bom convívio, jogo de cintura, saber lidar com ele, que era uma boa pessoa. De vez em quando, ele ia para Iugoslávia, voltava fora do tempo, e eu conversava para trazer o jogador para mim e para o Flamengo. O técnico tem que ter um pouco de psicologia. Eu era como um pai, já que o Pet tem idade para ser meu filho. Ele é um cara bacana, jogava demais. Eu precisava dele dentro do time. Ele era diferenciado. Não sei como na Iugoslávia não foi titular da seleção. Não foi lá, mas felizmente foi junto comigo conquistando um grande título. Parabéns para você, Pet. Que bom eu ter te conhecido. Mesmo com os problemas, você soube lidar comigo, eu soube lidar com você, e nós ganhamos juntos um tricampeonato. Dentro do Maracanã, foi o meu grande título daquele ano. Depois, na minha despedida, ainda conquistamos a Copa dos Campeões sobre o São Paulo, com outro gol de falta do Pet.
Pet honrou a mística da camisa 10 do Flamengo?
Não tem dúvida. A 10 do Flamengo tem um grande significado na vida rubro-negra. Chama-se Zico, que foi o grande 10, fez chover e ganhou muitos títulos. Numa época diferente, não tinha o Zico, mas apareceu um gringo, um gringo chamado Pet, que soube honrar a camisa 10, jogou maravilhosamente, e, em 2001, relembrou grandes feitos do vitorioso Zico.
É possível resumir em uma ou poucas palavras aquele momento de 2001?
Eu não tenho mais palavras para falar. Era fração de segundos para ganhar o título. A torcida, a fé, a imagem de Santo Antônio na minha mão, pensei: "É, vai ser agora, vai ser mesmo". E não deu outra. Deus me abençoou, iluminou a mim e ao Pet.
O senhor consegue pensar como foi do outro lado, a tristeza dos vascaínos que comemoravam até os 43 minutos do segundo tempo?
Eu pensei primeiro no título que poderia ser conquistado. Vi e convivi com a derrota do adversário. A alegria que momentos antes eles estavam era minha naquele momento. A tristeza do Joel. As baforadas do Eurico Miranda na beira do campo antes do gol. O título era nosso.
O então treinador Zagallo vestindo a camisa rubro-negra e de colete, à beira do campo na partida contra o Vasco, no Maracanã, em 2001 (Foto: Hipólito Pereira/Agência O Globo)
Aos 79 anos, Zagallo afirma que a conquista diante da torcida do Flamengo em um Maracanã lotado apagou um pouco sua dor pela vitória do Uruguai sobre a Seleção Brasileira, em 1950, no estádio carioca. O técnico revela o discurso que adotou para amenizar os problemas de relacionamento entre Petkovic e Edílson, exalta sua carreira vitoriosa no Rubro-Negro e recorda a imagem de Eurico Miranda, então presidente do Vasco, já no gramado, dando baforadas no charuto à espera do título que não veio.Com um currículo vitorioso, Zagallo ainda tinha uma dose de emoção guardada para a reta final de sua carreira como técnico. E bem no final, aos 43 minutos do segundo tempo, na sua última conquista no Maracanã. Naquele 27 de maio de 2001, agarrado à sua imagem de Santo Antônio, o Velho Lobo só tinha um pedido:
- Era fração de segundos para ganhar o título. Com a torcida, a fé, a imagem de Santo Antônio na minha mão, pensei: "É, vai ser agora, vai ser mesmo’. E não deu outra. Deus me abençoou, iluminou a mim e ao Pet.
Dia 27 de maio de 2001. Dez anos se passaram. Nesta data, o senhor também vai relembrar tudo que aconteceu no Maracanã? Mesmo tanto tempo depois, ainda arrepia?
Você falou no arrepio e ele já veio (mostra os pelos do braço arrepiados). Veio porque é deslumbrante. Você conviver, viver aquilo que aconteceu em 2001. Estamos em 2011, lembro os detalhes como um filme que passa a toda hora, todo instante, todo momento. Estou falando aqui e vejo o Pet colocar a bola no gramado, se preparar para chutar. E eu torcendo como nunca para que ela entrasse. Só com o Pet, que chutava muito bem, aquela bola poderia conseguir o impossível. O impossível aconteceu: a bola colocada no ângulo, fora do alcance do Helton, que hoje está em Portugal fazendo milagres. Mas o milagroso dessa falta foi o chute determinado, imposto pela sua categoria e a vontade de que aquele terceiro gol entrasse naquele ângulo. Deus quis que o título, aquele jogo, aquele gol mostrassem a realidade de um jogador fabuloso que foi o Pet, fazendo o terceiro gol para vibrar sozinho, depois com todos os jogadores e com a majestade da torcida maravilhosa que é a do Flamengo. Naquele dia, tudo era ansiedade, desde a concentração, a subida no ônibus, o caminho para o Maracanã, a imensa torcida ao lado do ônibus gritando "Mengo, Mengo, vamos ganhar". São memórias que ficam e jamais sairão da minha retina.
A conquista do tricampeonato sobre o Vasco, da forma como foi, teve o mesmo gosto de uma Copa do Mundo?
Às vezes, até mais. Naquele tricampeonato, eu estava dentro do meu país, no Maracanã, onde tive uma decepção tremenda. Como soldado da polícia do exército, estava no Maracanã e vi o Brasil perder para o Uruguai a final da Copa de 1950. Nesse mesmo estádio, repleto de uma torcida inflamada como a do Flamengo, o tricampeonato com o gol do Pet foi uma verdadeira Copa do Mundo. Por exemplo: em 1970, foi sensacional, meu terceiro título mundial, o primeiro como técnico da Seleção Brasileira. Estava no México, o mundo passava através da minha cabeça, pensava no Brasil, no Maracanã. No tricampeonato pelo Flamengo, eu estava no Maracanã com a torcida preta e vermelha toda gritando "Mengo, Mengo, Mengo". Não é fácil.
Naquela decisão, além da superação dentro de campo, foi preciso vencer uma série de problemas internos, rixa entre Pet e Edílson. Como o senhor fez para unir o grupo na busca pelo título, ainda mais depois da derrota por 2 a 1 na primeira partida da final?
Quem vê uma vitória final não sabe o que passamos durante a competição em 2001. Houve problemas internos, todos sabiam que o Pet e Edílson não se davam, aconteceram várias reuniões: eu com o grupo, o elenco sozinho para falar sobre o assunto, pois já estava quase na véspera do jogo e nós estávamos abordando o caso. Disse que tínhamos que trabalhar, nos unir, pois dentro de campo o que vale é o preto e vermelho, a união. Se fora de campo eles (Pet e Edílson) não se davam, era outra questão. Dentro do jogo, a coisa tinha que ser diferente. E realmente foi. Levamos os problemas a um bom senso, de fato os jogadores se uniram e fomos para o Maracanã com um único objetivo: ganhar o tricampeonato. E conseguimos, com sangue, suor e lágrimas.
E o Edílson marcou dois gols, um deles de cabeça depois de passe do Pet, e também sofreu a falta que originou no gol do título...
Sim. O Edílson fez um gol de cabeça com um passe do Pet. Eles estavam ligadões, pensando só no jogo, na vitória, não pensavam mais nos problemas extracampo. Isso foi fundamental para o trabalho do grupo pela vitória.
Zagallo assiste ao gol de falta de Petkovic, dez anos depois, e mostra os pelos do braço arrepiados durante entrevista (Foto: Pedro Veríssimo / Globoesporte.com)
Esta conquista ficou muito marcada para os torcedores do Flamengo. Dez anos depois, como é a relação da torcida quando aborda o senhor na rua?Hoje, qualquer telefone celular tira foto. Quando o torcedor fala comigo, cita o gol do Pet, comemora, diz que tem que agradecer a vida toda por aquela conquista. Apesar de o tempo ter passado, eles querem uma foto comigo. E lembram também a frase "vocês vão ter que me engolir". Sou querido pelo povo brasileiro.
Hoje, quando o senhor lembra do título, a emoção ainda é visível. Como é essa ligação com o clube, o tricampeonato, a paixão rubro-negra?
O Flamengo marcou minha vida. Jogava no juvenil do América em 48 e 49, depois fui para o exército. Lá tinha um jogador, o lateral Gerson, que era do juvenil do Flamengo e que me fez o convite para ir até o clube. No América, nunca tinha recebido dinheiro, era um sócio-contribuinte, meu pai pagava 20 mil réis para eu jogar vôlei, pingue-pongue, fazer natação e futebol. Eu pagava para jogar. O Jaime de Almeida, que era o técnico do Flamengo na época, gostou, e fizeram minha transferência para o Flamengo usando como ponte o Canto do Rio. Foi uma nova vida futebolística. Como jogador, fui tricampeão pelo Flamengo em 1953, 54, 55, já tinha raízes. Depois, a vida continuou, retornei ao Flamengo e encerrei minha carreira como técnico no clube. No final da minha vida, tive uma alegria como a de 2001. Foi uma felicidade total. Depois de ser tri como jogador, Deus me proporcionou estar no tricampeonato como treinador.
Podemos dizer que o Pet ajudou nesse desfecho com chave de ouro? O que pode falar dele como jogador e pessoa?
Falar sobre o Pet é importante na minha vida, pelo convívio que tive nesse período, na conquista do tricampeonato. Ele era um jogador difícil. O treinador tinha que ter um bom convívio, jogo de cintura, saber lidar com ele, que era uma boa pessoa. De vez em quando, ele ia para Iugoslávia, voltava fora do tempo, e eu conversava para trazer o jogador para mim e para o Flamengo. O técnico tem que ter um pouco de psicologia. Eu era como um pai, já que o Pet tem idade para ser meu filho. Ele é um cara bacana, jogava demais. Eu precisava dele dentro do time. Ele era diferenciado. Não sei como na Iugoslávia não foi titular da seleção. Não foi lá, mas felizmente foi junto comigo conquistando um grande título. Parabéns para você, Pet. Que bom eu ter te conhecido. Mesmo com os problemas, você soube lidar comigo, eu soube lidar com você, e nós ganhamos juntos um tricampeonato. Dentro do Maracanã, foi o meu grande título daquele ano. Depois, na minha despedida, ainda conquistamos a Copa dos Campeões sobre o São Paulo, com outro gol de falta do Pet.
Pet honrou a mística da camisa 10 do Flamengo?
Não tem dúvida. A 10 do Flamengo tem um grande significado na vida rubro-negra. Chama-se Zico, que foi o grande 10, fez chover e ganhou muitos títulos. Numa época diferente, não tinha o Zico, mas apareceu um gringo, um gringo chamado Pet, que soube honrar a camisa 10, jogou maravilhosamente, e, em 2001, relembrou grandes feitos do vitorioso Zico.
É possível resumir em uma ou poucas palavras aquele momento de 2001?
Eu não tenho mais palavras para falar. Era fração de segundos para ganhar o título. A torcida, a fé, a imagem de Santo Antônio na minha mão, pensei: "É, vai ser agora, vai ser mesmo". E não deu outra. Deus me abençoou, iluminou a mim e ao Pet.
O senhor consegue pensar como foi do outro lado, a tristeza dos vascaínos que comemoravam até os 43 minutos do segundo tempo?
Eu pensei primeiro no título que poderia ser conquistado. Vi e convivi com a derrota do adversário. A alegria que momentos antes eles estavam era minha naquele momento. A tristeza do Joel. As baforadas do Eurico Miranda na beira do campo antes do gol. O título era nosso.
Zagallo faz sinal em referência ao tri: 'O impossível aconteceu' (Foto: Pedro Veríssimo / Globoesporte.com)
FONTE GLOBO ESPORTE.COM
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27/05/2011 11h50 - Atualizado em 27/05/2011 11h50
A derrota inesquecível de Joel: ‘Meu time era muito melhor que o do Fla’
Técnico do Vasco no Carioca de 2001 se rende ao talento de Pet: ‘Só um jogador assim teria competência de fazer um gol naquele momento’
Joel Santana chega apressado à entrevista e com hora para sair por conta de outro compromisso. Deixa o telefone celular no silencioso, ajuda a equipe a colocar o microfone, senta-se e abusa da irreverência. As duas primeiras perguntas da conversa, num restaurante bem perto da praia da Copacabana, na Zona Sul, são dele. A resposta também.
- Vamos falar sobre o quê? Sobre Pet? Ele é meu amigo, mas não vou jogar confete para ele, não.
- Não preciso assistir. Aquele lance está aqui (aponta para a cabeça) - disse o comandante vascaíno naquela época, ao se recusar a rever a jogada que deu o tricampeonato ao Flamengo do Velho Lobo.
Convencido pela reportagem, Joel, atualmente sem clube, enxerga um Joel mais magro na tela do computador. Já vitorioso, dez anos mais moço, expressão sisuda à beira do gramado do Macaranã. Chateado mesmo, quase com cara de choro. Aquela falta, aqueles 43 minutos do segundo tempo, aquela derrota... nem a prancheta nervosa - como ele diz - evitaria.
- Quando o árbitro marca a falta naquele momento do jogo (assista ao vídeo ao lado), e o Flamengo com um batedor como o Pet, você não gosta de um lance de frente para a área para um jogador daquela qualidade. Só numa falta batida com aquela competência e com aquela qualidade é que poderia sair um gol. Como saiu.
Um lance marcante mesmo para quem tem tanta história para contar. Mais um dentre tantos que contrariam a lógica.
- Meu time era muito melhor que o do Flamengo. Pelo que me lembro, tinha Romário, Euller, Viola, tinha Pedrinho, tinha Jorginho. Tinha Juninho Paulista, Juninho Pernambucano. Olha só! Estava esquecendo esses dois jogadores. A nossa campanha, a nossa vantagem era muito grande - analisou Joel, cometendo equívoco apenas na escalação de Juninho Pernambucano, que já havia deixado o clube.
Depois da vitória do seu time na primeira partida da final, por 2 a 1, a derrota pelo mesmo placar levaria o título para São Januário. Pet estabeleceu o 3 a 1. A vantagem não resistiu ao talento do sérvio, algo que o treinador faz questão de ressaltar.
- Sobre Pet, Romário, Roberto (Dinamite) e muitos e muitos outros jogadores, você não fala muito porque o nome já diz que são diferenciados. Ele é top de linha. Para jogador mais ou menos é que a gente fica dando explicação.
Confira abaixo a íntegra da entrevista.
Revendo o lance, uma das imagens antes da cobrança é a sua expressão chateada pela marcação da falta. Era um momento em que dava para ter parado o jogo no meio-campo, não precisava ter deixado a bola chegar tão perto da área?
É muito fácil falar depois de vários anos, arrumar algum tipo de desculpa, algum tipo de defeito. Algumas coisas no futebol acontecem ali na hora. Eu nem achei que foi falta assim. Mas foi questão da arbitragem, e ele (o ex-árbitro Léo Feldman) deixou o lance correr. O lance seguiu com um córner que nós fizemos e não sabíamos se era córner ou falta. Quando ele marca a falta naquele momento do jogo, e o Flamengo com um batedor como o Pet, você não gosta de um lance de frente para a área para um jogador daquela qualidade. Apesar de que, minutos antes, ele tinha pedido para sair. Ele e um outro jogador, não me lembro quem foi, que estava com o joelho inchado. E o Pet com muita cãibra. Aí o preparador físico tirou o outro jogador. Ele permaneceu. Pela distância da bola e pelo goleiro que tínhamos, que é um baita de um goleiro, o Helton, que está lá no Porto agarrando muito, só numa falta batida com aquela competência e com aquela qualidade é que poderia sair um gol. Como saiu. Foi um lance de pura qualidade técnica de um jogador que resolveu um clássico. Foi um jogo atípico, porque no primeiro tempo jogamos muito bem, mas deixamos criar uma jogada que era a única que poderia sair o gol naquela altura dos acontecimentos.
Seu time era melhor que o do Flamengo?
Meu time era muito melhor que o do Flamengo. Pelo que me lembro, tinha Romário, Euller, Viola, tinha Pedrinho, tinha Jorginho. A nossa campanha, a nossa vantagem era muito grande. Realmente, se você colocasse no papel, o time do Flamengo era muito novo. O Juan (zagueiro, hoje no Roma) estava na primeira decisão, que é um jogador que eu conheço muito bem. Tem tanta qualidade que foi a duas Copas do Mundo (2006 e 2010). O Fernando estava chegando. O Julinho (Julio César, goleiro do Inter de Milão) estava começando. Olha a qualidade dos jogadores. Hoje, todos em grandes equipes, todos em Seleção Brasileira. Jogadores que estavam crescendo, que eu comecei a lançar quando estive no Flamengo. Sabia da qualidade e da competência desses jogadores. Não abrir a vantagem no primeiro tempo deu ao adversário condições de ele lutar pelo jogo até o fim.
Como foi a conversa com o time antes do jogo?
O time estava tranquilo. Nós vínhamos fazendo uma campanha de Libertadores e de Campeonato Carioca muito boa. Depois do nosso primeiro tempo, entramos reclamando muito no vestiário, pela quantidade de gols que nós perdemos. E nós sabemos que em clássico você não pode perder tantos gols. E no segundo tempo foi um jogo lá e cá, lá e cá. Antes desse lance do gol, nós tivemos uma oportunidade muito mais clara e não conseguimos fazer. Era jogo de um detalhe. E em um detalhe o Pet foi lá e matou o jogo.
O fato de o Vasco ter perdido os dois campeonatos anteriores fez o grupo entrar sob uma pressão maior?
O time era muito maduro, cara. Nosso time era frio. Fomos o clube que ganhou mais jogos seguidos na Libertadores daquele ano. Foram oito jogos seguidos. O time era maduro, plantado, postado. Time que sabia o que queria em campo, tinha maneira de jogar, nossas mexidas eram certas. Infelizmente no futebol o resultado final é o que conta. Era um time muito bom. Talvez um dos melhores times em termos de jogadores que eu trabalhei. Era muito compacto. Mas naquele jogo o Flamengo foi mais feliz.
O gol aconteceu aos 43 minutos do segundo tempo. O Vasco já comemorava. Você lembra da imagem do Eurico Miranda (ex-presidente), à beira do campo, fumando charuto?
Não me lembro, não olhei para trás. Só olhei para trás no momento da falta, que eu vi até um profissional que hoje está no Flamengo, que é o professor Isaías (Tinoco, gerente de futebol rubro-negro). Olhei para ele como se dissesse “esse não era o momento de fazer uma falta daquelas". Porque sabíamos da competência, da qualidade que eles tinham.
Faltou um pouco de malandragem?
Houve alguma conversa no vestiário depois da derrota?
Não dá para falar, não tem conversa. É título, principalmente de um campeonato que nós corremos tão na frente. Nós viemos na frente o campeonato todo. Ali, no final, tivemos algumas situações de lesão. Na realidade, nós tivemos uma sequência de jogos em 15, 20 dias, muito dura. E nós perdemos duas competições, a Libertadores e o Campeonato Carioca. A Libertadores porque jogamos duas vezes contra o Boca (Juniors, da Argentina) e duas vezes contra o Flamengo. Nosso desgaste foi muito grande. Até ali, antes de chegarmos às decisões, a equipe estava muito boa. Mas nós perdemos o nosso principal jogador, que era o Romário. Ele teve uma contratura na perna num jogo que nós fizemos no Chile, pela Libertadores. E essa perda foi sentida porque ele era o artilheiro, era o finalizador, era o ídolo. E era como se fosse um coringa. Você não pode perder um coringa num jogo final. Mas é futebol. É assim. Já ganhei título aos 43 e perdi esse com gol aos 43 também. Futebol você ri e chora ao mesmo tempo. Mas só quem chega em tantas finais como eu cheguei tem condições de contar um jogo como esse, onde o Vasco tinha uma equipe muito boa e o Flamengo tinha uma equipe se reformulando muito boa também.
Lembra do jogo com frequência?
É mais um dos jogos que passam pela minha cabeça das decisões. É um dos jogos que vão fazer parte do meu livro também. Não vai ser só de vitórias, de oito cariocas conquistados. Este seria o nono. Com esse título, eu estaria como o líder absoluto de títulos nesse estado. Mas foi legal, foi um campeonato muito bacana.
Nós entrevistamos o Fabiano Eller, que foi quem cometeu a falta, e ele disse que consegue olhar para o gol e ver só um belíssimo lance. Você consegue ver essa beleza também?
O gol foi muito bem feito. Você vê nas imagens que a bola praticamente sai da direção do gol, pega um efeito e volta para dentro do gol. O Helton consegue ir nela, consegue esbarrar a ponta dos dedos na bola. Mas é uma precisão muito grande. É uma em cem que você acerta. E ele acertou. Só uma qualidade de um jogador como o Pet, Juninho Paulista, Juninho Pernambucano. Opa! Esqueci desses dois jogadores. Olha só. Olha o nosso time, que time que era. Só um jogador assim teria competência de fazer um gol naquele momento. O cara tem que ter a precisão, é um tiro só, matar ou morrer. Ele matou e a gente morreu.
Aquela derrota encurtou sua passagem no Vasco naquele momento?
Não sei. Um título é um título. Você não ganha todo dia. Você não bota sua fotografia dentro do estádio todos os dias. Só com título. Equipes se renovam a todo momento. Esse título estaria gravado lá nos murais do Vasco como todos os títulos que eu ganhei lá. Mercosul, Campeonato Brasileiro, Campeonato Carioca, campeonato invicto, Copa de Ouro.
O que você pode falar do Pet?
Um craque que nem precisa falar muito. Craque a gente não fala muito, sabe da competência do jogador. Jogador que não é bom a gente fica falando muito. Pet, Romário, Roberto (Dinamite) e muitos e muitos outros jogadores você não fala muito porque o nome já diz que ele é diferenciado. Ele é top de linha. Jogador mais ou menos a gente fica dando explicação.
Já conversou com ele sobre o gol?
Rapaz, encontrei com o Pet há três meses, dois meses, na casa de um amigo. Mas nós não falamos sobre isso não, cara. Falei com o árbitro do jogo uma vez, falei que não foi falta e perguntei o que o levou a deixar o lance correr e depois voltar a jogada. Ele falou que o Vasco, naquela oportunidade, parecia um time de anjo. Realmente aparece na imagem que a defesa não agrediu a bola. Se ela agride, o árbitro não mandaria voltar. Estava muito em cima para terminar o jogo. O time ficou muito correto, obedeceu muito a regra do jogo. Ali, claro que tem de obedecer, você tinha de ser desobediente. Jamais aconteceria esse lance com um time espanhol ou com um time italiano. Eles agrediriam a bola para mais de cinco metros para tirar a visão do batedor.
Vitórias definem a história de uma pessoa, mas as derrotas marcam de uma maneira importante. Nesses dez anos, acha que algo teria sido diferente na sua vida?
Às vezes, você aprende mais na derrota do que na vitória. Futebol é um jogo como outro qualquer. Tem que saber jogar o jogo. Às vezes, a vitória deixa você de tal maneira que não se preocupa com o futuro. A derrota vai mostrar onde errou para melhorar. Seria mais um título dentro da minha carreira. Depois daquilo, conquistei outros em função daquele jogo. Aquele jogo marcou como qualquer outro marcaria. Temos de aprender que na vida a gente não vence tudo. Claro que ninguém gosta de perder, também não gosto, principalmente num clássico. Como já passei pelos quatro clubes e já decidi por todos os clubes contra todo mundo. Olha só! Foi normal. Os oito títulos que ganhei não tenho preferência, ficaram gravados na minha vida como ficou esse que nós perdemos.
Tantas coisas se passaram na minha vida. Estou lembrando até de fatos que não lembrava mais. Quando foi aquilo? Foi em 2001. Nem me lembro para onde fui em 2002, 2003. Eu sou um andarilho, sou um cigano, aí já passei por diversas equipes, já voltei no Vasco, já fui no Flamengo, já voltei no Fluminense, já fui no Botafogo, é muito difícil ficar lembrando de dez anos atrás. Tenho de parar e começar a narrar, ir lembrando o que aconteceu. Realmente foi um jogo diferenciado e talvez jamais eu esqueça.
Quando o time do Vasco foi dar a saída de bola, dá para ver que você não conseguiu falar nada para os jogadores. Tentou?
Não dá para falar nada. Acho que uns dois se jogaram no chão porque ninguém esperava tomar um gol naquele momento. Como vai falar mais alguma coisa faltando um minuto? Não tem condição.
Lembra de ter olhado para as arquibancadas do Maracanã? Lembra da reação das torcidas?
Tem coisas na vida que você não vê mais nada, não escuta mais nada. Fica quieto. Mesma coisa quando é campeão. Bate aquele lance na sua cabeça. Na maioria dos títulos fui para o vestiário. A ficha só vai cair no outro dia. A mesma coisa num jogo como aquele. A ficha não cai. Até cair demora um tempo. Mas não é por isso que o mundo acabou.
E quando caiu a ficha?
Não sei te explicar. Em dez anos muitas coisas aconteceram na minha vida. Vai ver que ela caiu e eu até esqueci. Foi embora, já era. A vida continua, cara. Não tenho de murmurar coisas que perdi. Temos de lembrar coisas que fazem bem. Você foi um grande infeliz fazendo essa matéria (risos). Você não se deu bem, cara. Você vai cortar isso daí, sei que você vai cortar (risos). Mas essa é a parte boa da matéria. Tinha tanta coisa para falar sobre mim. A ficha já era, já foi, acabou. Gosto de lembrar de coisa boa. Todo mundo se lembra de festa, ninguém se lembra de morte. Eu sou assim. Coisa ruim eu passo a borracha, deleto. Coisa boa eu lembro todo dia. Se você fosse falar dos meus títulos, eu ficaria com você dois dias. Mas você é alemão (gargalhadas). Mas a matéria foi legal, está tudo certo. Vamos que vamos. Não é por isso que você vai ser meu inimigo. Toca aqui!
- Vamos falar sobre o quê? Sobre Pet? Ele é meu amigo, mas não vou jogar confete para ele, não.
Joel Santana não esconde que a derrota de 2001 o marcou (Foto: Thiago Correia / GLOBOESPORTE.COM)
Se Zagallo se arrepia ao falar do dia 27 de maio de 2001, Joel tem calafrios imunes aos 62 anos de idade, três décadas como treinador e oito títulos cariocas, além de um nacional e internacional com o Vasco. Não fosse o gol de Petkovic, seriam nove conquistas estaduais.- Não preciso assistir. Aquele lance está aqui (aponta para a cabeça) - disse o comandante vascaíno naquela época, ao se recusar a rever a jogada que deu o tricampeonato ao Flamengo do Velho Lobo.
Convencido pela reportagem, Joel, atualmente sem clube, enxerga um Joel mais magro na tela do computador. Já vitorioso, dez anos mais moço, expressão sisuda à beira do gramado do Macaranã. Chateado mesmo, quase com cara de choro. Aquela falta, aqueles 43 minutos do segundo tempo, aquela derrota... nem a prancheta nervosa - como ele diz - evitaria.
- Quando o árbitro marca a falta naquele momento do jogo (assista ao vídeo ao lado), e o Flamengo com um batedor como o Pet, você não gosta de um lance de frente para a área para um jogador daquela qualidade. Só numa falta batida com aquela competência e com aquela qualidade é que poderia sair um gol. Como saiu.
Um lance marcante mesmo para quem tem tanta história para contar. Mais um dentre tantos que contrariam a lógica.
- Meu time era muito melhor que o do Flamengo. Pelo que me lembro, tinha Romário, Euller, Viola, tinha Pedrinho, tinha Jorginho. Tinha Juninho Paulista, Juninho Pernambucano. Olha só! Estava esquecendo esses dois jogadores. A nossa campanha, a nossa vantagem era muito grande - analisou Joel, cometendo equívoco apenas na escalação de Juninho Pernambucano, que já havia deixado o clube.
Depois da vitória do seu time na primeira partida da final, por 2 a 1, a derrota pelo mesmo placar levaria o título para São Januário. Pet estabeleceu o 3 a 1. A vantagem não resistiu ao talento do sérvio, algo que o treinador faz questão de ressaltar.
- Sobre Pet, Romário, Roberto (Dinamite) e muitos e muitos outros jogadores, você não fala muito porque o nome já diz que são diferenciados. Ele é top de linha. Para jogador mais ou menos é que a gente fica dando explicação.
Confira abaixo a íntegra da entrevista.
Revendo o lance, uma das imagens antes da cobrança é a sua expressão chateada pela marcação da falta. Era um momento em que dava para ter parado o jogo no meio-campo, não precisava ter deixado a bola chegar tão perto da área?
É muito fácil falar depois de vários anos, arrumar algum tipo de desculpa, algum tipo de defeito. Algumas coisas no futebol acontecem ali na hora. Eu nem achei que foi falta assim. Mas foi questão da arbitragem, e ele (o ex-árbitro Léo Feldman) deixou o lance correr. O lance seguiu com um córner que nós fizemos e não sabíamos se era córner ou falta. Quando ele marca a falta naquele momento do jogo, e o Flamengo com um batedor como o Pet, você não gosta de um lance de frente para a área para um jogador daquela qualidade. Apesar de que, minutos antes, ele tinha pedido para sair. Ele e um outro jogador, não me lembro quem foi, que estava com o joelho inchado. E o Pet com muita cãibra. Aí o preparador físico tirou o outro jogador. Ele permaneceu. Pela distância da bola e pelo goleiro que tínhamos, que é um baita de um goleiro, o Helton, que está lá no Porto agarrando muito, só numa falta batida com aquela competência e com aquela qualidade é que poderia sair um gol. Como saiu. Foi um lance de pura qualidade técnica de um jogador que resolveu um clássico. Foi um jogo atípico, porque no primeiro tempo jogamos muito bem, mas deixamos criar uma jogada que era a única que poderia sair o gol naquela altura dos acontecimentos.
Seu time era melhor que o do Flamengo?
Meu time era muito melhor que o do Flamengo. Pelo que me lembro, tinha Romário, Euller, Viola, tinha Pedrinho, tinha Jorginho. A nossa campanha, a nossa vantagem era muito grande. Realmente, se você colocasse no papel, o time do Flamengo era muito novo. O Juan (zagueiro, hoje no Roma) estava na primeira decisão, que é um jogador que eu conheço muito bem. Tem tanta qualidade que foi a duas Copas do Mundo (2006 e 2010). O Fernando estava chegando. O Julinho (Julio César, goleiro do Inter de Milão) estava começando. Olha a qualidade dos jogadores. Hoje, todos em grandes equipes, todos em Seleção Brasileira. Jogadores que estavam crescendo, que eu comecei a lançar quando estive no Flamengo. Sabia da qualidade e da competência desses jogadores. Não abrir a vantagem no primeiro tempo deu ao adversário condições de ele lutar pelo jogo até o fim.
Como foi a conversa com o time antes do jogo?
O time estava tranquilo. Nós vínhamos fazendo uma campanha de Libertadores e de Campeonato Carioca muito boa. Depois do nosso primeiro tempo, entramos reclamando muito no vestiário, pela quantidade de gols que nós perdemos. E nós sabemos que em clássico você não pode perder tantos gols. E no segundo tempo foi um jogo lá e cá, lá e cá. Antes desse lance do gol, nós tivemos uma oportunidade muito mais clara e não conseguimos fazer. Era jogo de um detalhe. E em um detalhe o Pet foi lá e matou o jogo.
O fato de o Vasco ter perdido os dois campeonatos anteriores fez o grupo entrar sob uma pressão maior?
O time era muito maduro, cara. Nosso time era frio. Fomos o clube que ganhou mais jogos seguidos na Libertadores daquele ano. Foram oito jogos seguidos. O time era maduro, plantado, postado. Time que sabia o que queria em campo, tinha maneira de jogar, nossas mexidas eram certas. Infelizmente no futebol o resultado final é o que conta. Era um time muito bom. Talvez um dos melhores times em termos de jogadores que eu trabalhei. Era muito compacto. Mas naquele jogo o Flamengo foi mais feliz.
O gol aconteceu aos 43 minutos do segundo tempo. O Vasco já comemorava. Você lembra da imagem do Eurico Miranda (ex-presidente), à beira do campo, fumando charuto?
Não me lembro, não olhei para trás. Só olhei para trás no momento da falta, que eu vi até um profissional que hoje está no Flamengo, que é o professor Isaías (Tinoco, gerente de futebol rubro-negro). Olhei para ele como se dissesse “esse não era o momento de fazer uma falta daquelas". Porque sabíamos da competência, da qualidade que eles tinham.
Faltou um pouco de malandragem?
Joel diz que os vascaínos poderiam ter atrapalhado
Pet (Foto: Thiago Correia / GLOBOESPORTE.COM)
Faltou um pouco de experiência, não é nem malandragem. Você agride a bola (os jogadores que estão na barreira costumam avançar). Mas isso você aprende no júnior, no juvenil. Quando chega ao profissional, não precisa nem avisar uma coisa como essa. É uma coisa normal. O árbitro contou a distância da falta, os 9,15 m da barreira, e ninguém tentou cortar um pouquinho o pensamento do jogador. Se um tenta agredir a bola, aí o árbitro vai mandar voltar. Depois um outro agride, ele vai dar cartão, mas que se dane! Se agride o time todo, ele não ia mandar repetir. Mas isso é futebol. Você ganha, empata ou perde. Você tem de saber ganhar, como já ganhei muitos títulos, e tem de saber perder. Perdemos porque faltou um detalhe no fim do jogo. Detalhe que nesse tipo de jogo não pode deixar faltar. E se faltar você vai perder de novo.Pet (Foto: Thiago Correia / GLOBOESPORTE.COM)
Houve alguma conversa no vestiário depois da derrota?
Não dá para falar, não tem conversa. É título, principalmente de um campeonato que nós corremos tão na frente. Nós viemos na frente o campeonato todo. Ali, no final, tivemos algumas situações de lesão. Na realidade, nós tivemos uma sequência de jogos em 15, 20 dias, muito dura. E nós perdemos duas competições, a Libertadores e o Campeonato Carioca. A Libertadores porque jogamos duas vezes contra o Boca (Juniors, da Argentina) e duas vezes contra o Flamengo. Nosso desgaste foi muito grande. Até ali, antes de chegarmos às decisões, a equipe estava muito boa. Mas nós perdemos o nosso principal jogador, que era o Romário. Ele teve uma contratura na perna num jogo que nós fizemos no Chile, pela Libertadores. E essa perda foi sentida porque ele era o artilheiro, era o finalizador, era o ídolo. E era como se fosse um coringa. Você não pode perder um coringa num jogo final. Mas é futebol. É assim. Já ganhei título aos 43 e perdi esse com gol aos 43 também. Futebol você ri e chora ao mesmo tempo. Mas só quem chega em tantas finais como eu cheguei tem condições de contar um jogo como esse, onde o Vasco tinha uma equipe muito boa e o Flamengo tinha uma equipe se reformulando muito boa também.
Lembra do jogo com frequência?
É mais um dos jogos que passam pela minha cabeça das decisões. É um dos jogos que vão fazer parte do meu livro também. Não vai ser só de vitórias, de oito cariocas conquistados. Este seria o nono. Com esse título, eu estaria como o líder absoluto de títulos nesse estado. Mas foi legal, foi um campeonato muito bacana.
Nós entrevistamos o Fabiano Eller, que foi quem cometeu a falta, e ele disse que consegue olhar para o gol e ver só um belíssimo lance. Você consegue ver essa beleza também?
O gol foi muito bem feito. Você vê nas imagens que a bola praticamente sai da direção do gol, pega um efeito e volta para dentro do gol. O Helton consegue ir nela, consegue esbarrar a ponta dos dedos na bola. Mas é uma precisão muito grande. É uma em cem que você acerta. E ele acertou. Só uma qualidade de um jogador como o Pet, Juninho Paulista, Juninho Pernambucano. Opa! Esqueci desses dois jogadores. Olha só. Olha o nosso time, que time que era. Só um jogador assim teria competência de fazer um gol naquele momento. O cara tem que ter a precisão, é um tiro só, matar ou morrer. Ele matou e a gente morreu.
Aquela derrota encurtou sua passagem no Vasco naquele momento?
Não sei. Um título é um título. Você não ganha todo dia. Você não bota sua fotografia dentro do estádio todos os dias. Só com título. Equipes se renovam a todo momento. Esse título estaria gravado lá nos murais do Vasco como todos os títulos que eu ganhei lá. Mercosul, Campeonato Brasileiro, Campeonato Carioca, campeonato invicto, Copa de Ouro.
O que você pode falar do Pet?
Um craque que nem precisa falar muito. Craque a gente não fala muito, sabe da competência do jogador. Jogador que não é bom a gente fica falando muito. Pet, Romário, Roberto (Dinamite) e muitos e muitos outros jogadores você não fala muito porque o nome já diz que ele é diferenciado. Ele é top de linha. Jogador mais ou menos a gente fica dando explicação.
Já conversou com ele sobre o gol?
Rapaz, encontrei com o Pet há três meses, dois meses, na casa de um amigo. Mas nós não falamos sobre isso não, cara. Falei com o árbitro do jogo uma vez, falei que não foi falta e perguntei o que o levou a deixar o lance correr e depois voltar a jogada. Ele falou que o Vasco, naquela oportunidade, parecia um time de anjo. Realmente aparece na imagem que a defesa não agrediu a bola. Se ela agride, o árbitro não mandaria voltar. Estava muito em cima para terminar o jogo. O time ficou muito correto, obedeceu muito a regra do jogo. Ali, claro que tem de obedecer, você tinha de ser desobediente. Jamais aconteceria esse lance com um time espanhol ou com um time italiano. Eles agrediriam a bola para mais de cinco metros para tirar a visão do batedor.
Vitórias definem a história de uma pessoa, mas as derrotas marcam de uma maneira importante. Nesses dez anos, acha que algo teria sido diferente na sua vida?
Às vezes, você aprende mais na derrota do que na vitória. Futebol é um jogo como outro qualquer. Tem que saber jogar o jogo. Às vezes, a vitória deixa você de tal maneira que não se preocupa com o futuro. A derrota vai mostrar onde errou para melhorar. Seria mais um título dentro da minha carreira. Depois daquilo, conquistei outros em função daquele jogo. Aquele jogo marcou como qualquer outro marcaria. Temos de aprender que na vida a gente não vence tudo. Claro que ninguém gosta de perder, também não gosto, principalmente num clássico. Como já passei pelos quatro clubes e já decidi por todos os clubes contra todo mundo. Olha só! Foi normal. Os oito títulos que ganhei não tenho preferência, ficaram gravados na minha vida como ficou esse que nós perdemos.
O treinador diz que a derrota trouxe muitos ensinamentos (Foto: Thiago Correia / GLOBOESPORTE.COM)
Você tem saudade daquela época?Tantas coisas se passaram na minha vida. Estou lembrando até de fatos que não lembrava mais. Quando foi aquilo? Foi em 2001. Nem me lembro para onde fui em 2002, 2003. Eu sou um andarilho, sou um cigano, aí já passei por diversas equipes, já voltei no Vasco, já fui no Flamengo, já voltei no Fluminense, já fui no Botafogo, é muito difícil ficar lembrando de dez anos atrás. Tenho de parar e começar a narrar, ir lembrando o que aconteceu. Realmente foi um jogo diferenciado e talvez jamais eu esqueça.
Quando o time do Vasco foi dar a saída de bola, dá para ver que você não conseguiu falar nada para os jogadores. Tentou?
Não dá para falar nada. Acho que uns dois se jogaram no chão porque ninguém esperava tomar um gol naquele momento. Como vai falar mais alguma coisa faltando um minuto? Não tem condição.
Lembra de ter olhado para as arquibancadas do Maracanã? Lembra da reação das torcidas?
Tem coisas na vida que você não vê mais nada, não escuta mais nada. Fica quieto. Mesma coisa quando é campeão. Bate aquele lance na sua cabeça. Na maioria dos títulos fui para o vestiário. A ficha só vai cair no outro dia. A mesma coisa num jogo como aquele. A ficha não cai. Até cair demora um tempo. Mas não é por isso que o mundo acabou.
E quando caiu a ficha?
Não sei te explicar. Em dez anos muitas coisas aconteceram na minha vida. Vai ver que ela caiu e eu até esqueci. Foi embora, já era. A vida continua, cara. Não tenho de murmurar coisas que perdi. Temos de lembrar coisas que fazem bem. Você foi um grande infeliz fazendo essa matéria (risos). Você não se deu bem, cara. Você vai cortar isso daí, sei que você vai cortar (risos). Mas essa é a parte boa da matéria. Tinha tanta coisa para falar sobre mim. A ficha já era, já foi, acabou. Gosto de lembrar de coisa boa. Todo mundo se lembra de festa, ninguém se lembra de morte. Eu sou assim. Coisa ruim eu passo a borracha, deleto. Coisa boa eu lembro todo dia. Se você fosse falar dos meus títulos, eu ficaria com você dois dias. Mas você é alemão (gargalhadas). Mas a matéria foi legal, está tudo certo. Vamos que vamos. Não é por isso que você vai ser meu inimigo. Toca aqui!
FONTE GLOBO ESPORTE.COM
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